terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Ser Pomerano

“(…) Vasto é o mundo
Bastantes são os sonhos
O que queremos
Nós, pomeranos,
É simplesmente sermos também!
Sermos por muito tempo!”
[Celso Kalk – Mar Azul (Blåg Sei)]

Sempre encontro um monte de gente que ao ver minha cor, meu cabelo, meus traços e trejeitos me pergunta: “Você é descendente de alemães?”
Por muitas vezes me questionei se era ou não descendente de alemães. Na verdade, com o tempo descobri que sou POMERANA. Não sou só descendente de alemãs, nem descente de pomeranos e tão pouco de qualquer outra nacionalidade. Apesar de também ter descendência de outros povos, nomeio-me pomerana, pois se considerar assim não é somente ter algum gene perdido de alguém que morou há muitos anos em uma região que ocupava a parte nordeste da Alemanha e noroeste da Polônia.
Os Pomeranos, sendo eles residentes em Santa Maria de Jetibá, Pomerode, Vila Pavão, Rondônia, Estados Unidos ou em qualquer lugar do mundo, preservam tradições em comum que os fazem pertencer a esse mesmo grupo. Algumas são: Língua[1], Festas, Alimentação, Conceitos a respeito da vida, Religião.
Já vi muitas pessoas se assustarem quando ouviram ou quase não conseguiram ouvir minha avó paterna falar um “brasileiro” de gringo, muitos ao não se atentar a fala dela até acharam que ela não falava a língua oficial do nosso Brasil. Quando já tinha idade para isso, parei pra pensar porque isso acontecia... por que nas brincadeiras com meu primo quase não usávamos a linguagem falada, e também qual era o motivo do sotaque carregado de pessoas que conhecia. Percebi que a razão para isso tudo era orgulho. Sentimos tanto orgulho da nossa cultura que de forma consciente ou não utilizamos de vários mecanismos para preservá-la. Posso citar, assim, o ensino da língua pomerana como primeira. Ainda hoje é possível ver pais incentivando seu filho a aprender tal língua logo que começa a balbuciar e isso é muito bonito!
O que também é muito preservado - e é muito bom que seja – são as festas. A principal delas é o casamento. Por ser considerado um dos mais importantes “rituais de passagem”, ele é muito aguardado pela noiva, pelo noivo, seus pais, demais parentes e amigos. E não é só aguardado, mas todos eles também ajudam a planejar e executar tanto a cerimônia quanto a festa. Noivos, cozinheiras e copeiros[2] fazem de tudo para dar o mais animado e farto casamento para todos, até para os “penetras” da festa (eu já estive neste papel em vários festejos!). O casamento também tem vários ritos, como a “Dança da Noiva”, a bandeira com as iniciais dos noivos em um mastro e o vestido preto da noiva. Atualmente, as noivas de Santa Maria de Jetibá, município da região serrana do Espírito Santo, estão retomando este costume que veio da Europa. Os motivos cogitados para o uso da vestimenta são o luto pela diminuição do vínculo com a família primária e, o mais famoso, o protesto contra o autoritarismo do senhor feudal que impunha que a primeira noite da noiva deveria ser passada com ele.
No casamento também é possível identificar mais dois dos aspectos acima citados. A fartura deste evento pode ser observada na alimentação, que muitas vezes tem o café da tarde, o jantar e no meio da noite um “lanchinho”. Nestas refeições está presente o bolo ladrão; o café amargo; as carnes de porco, frango e boi; a batata; a sopa de ameixa; entre outros.
O outro aspecto é a religião. A maioria das cerimônias é realizada na igreja luterana, sendo esta Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), à qual pertenço, ou Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). A adesão à crença cristã pelos pomeranos veio da germanização do povo e continua até hoje. Anteriormente, os pomeranos tinham costumes eslavos, pois descendem desse povo. Por isso, ainda preservam alguns ritos pagãos como o “Quebra-Louça” que tem a função simbólica de espantar os maus espíritos. Temos algumas outras peculiaridades a respeito do casamento, que vão do convite feito pelo Convidador à duração do evento – três dias.
Além do aspecto físico, dos trejeitos, dos costumes, temos um modo de pensar que às vezes se repete de um para o outro. Como exemplo, temos a valorização da terra, da natureza. Muitos pomeranos vivem na, da e com a terra. A agricultura é um dos nossos meios mais importantes de sobrevivência. Os santamarienses, por exemplo, são um dos maiores produtores de hortifrutigranjeiros do país.
Finalizando, posso ainda dizer que ser pomerano é se sentir como tal! Pode-se até não viver no campo, não saber falar pomerano, não ser luterano, ou ainda não dançar a “Dança da Noiva”, mas quem se sente pomerano, emociona-se com esses elementos e é POMERANO!



[1] O antigo dialeto Pomerano agora pode ser considerado língua, pois foi oficializado como tal a partir da realização de dicionário e gramática pelo Prof. Dr. Ismael Tressman (Antropólogo).
[2] Os copeiros frenquentemente são amigos e, principalmente, parentes dos noivos que auxiliam no jantar e demais atividades da festa.

Um comentário:

  1. Interessante a pesquisa histórica e cultural da origem familiar! A história, a Língua e a cultura explicam e nos ensinam muitas coisas.

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